Onde não cabe o cantar do galo
As terras pequenas não cabem nas cidades grandes. Os centros concentram pessoas, mas não as centram no sossego dos dias e noites. Não há espaço para os sons e aromas. Até na escuridão seria demasiada a claridade para ver o que há para ver aqui. Nas terras pequenas cantam os galos, as galinhas e os grilos. Veem-se as estrelas e distinguem-se as constelações. As andorinhas alinham-se nos cabos da eletricidade, embora a rede móvel seja detalhe de cidade grande e, talvez por isso, não teime muito em existir por aqui. As rotinas são desempenhadas a tempo, ainda que com tempo e sem pressa. Assim toca o sino da igreja, embalando horas em badaladas certas. Os termómetros marcam outras temperaturas, são de extremos e desafiam estações do ano. As tradições não se perdem no alinhamento, conquanto muitas delas já não sejam o que eram. Há quem nunca daqui saia, há quem venha só de passagem. Porque é de passagem que se vive nas cidades grandes, mesmo que não sejam grandes cidades. Vão sendo poucos aqueles que habitam estas localidades perdidas nos mapas. Quem o faz, já o faz há muito tempo. Tempo suficiente para saber que cores como as que se pintam por aqui, não são a mesma coisa no ecrã de um telemóvel. A vida aqui é planeada, tem um ritmo moroso. As cidades grandes não saberiam acolher estas terras pequenas. E há sentido no que toca à distribuição geográfica conseguir evitar matrioskas. Perder-se-ia o melhor dos dois mundos.
Apesar do desenho no mapa, estas localidades, a que chamo “terras pequenas”, têm tudo menos uma dimensão minúscula.
Carol