Não desconfinem, ainda estou aqui!
Talvez me tenha feito valer do confinamento coletivo para usar [e abusar] de um recolher [quase] obrigatório, mas, acima de tudo, um tanto ou quanto necessário.
Vinte vinte – uma junção de números que soa tão bem, nunca nos fez suar mais – entregou-se por completo a um assustador desconhecido cujo nome já ninguém pode ouvir falar, primeiro porque não se fala noutra coisa e, segundo, porque parece que quanto mais falamos menos sabemos sobre o que estamos a falar. Assim, entre ser apenas mais um eco das demasiadas vozes que nos sussurram expressões que nunca esperámos ouvir fora de um filme de ficção científica ou permanecer no meu cantinho, optei por fazer jus ao meu silêncio. Um silêncio tão atónito quanto aquele que ainda hoje nos assombra de cada vez que lemos as notícias do dia.
Não é de loucos pensar que falta pouco mais de um mês para o ano terminar? E não foi como perfeitos loucos assumidos que conseguimos andar de mão dada com ele [ainda que, uma dúzia de vezes, pendurados no dedo mindinho]? Aprendemos a reduzir a imensidão de um mundo a números alarmantes que, no entanto, dizem tão pouco sobre as verdadeiras dimensões de tudo isto. Diz-se por aí que conhecemos uma nova realidade, nos reinventámos, nos teletransformámos, nos mascarámos e fizemos mais umas quantas coisas que, embrulhadas nestas novas expressões, até parecem ter tudo para dar certo, mas – e, caso tenham acordado agora de um coma, lamento ser eu a dar-vos esta novidade – não se deixem enganar. Vinte vinte também tinha tudo para ser música para os nossos ouvidos e vejam onde estamos agora. Malditas fake news, já dizia um velho e teimoso nosso conhecido [a quem o ano deu o merecido desfecho!].
Nem conhecidos, nem desconhecidos. 2020 não é ano para confiar em ninguém. Agora só confinamos, não confiamos. Que depois deste ano, quem não põe as mãos no fogo por mais ano nenhum [nem sequer por aqueles que tão bonitos ficam quando escritos na capa colorida da agenda] sei eu bem quem é.
E não, este [ainda] não é um texto reflexivo de fim de ano. Serve apenas para vos dizer que estou a ter um ano exatamente como o vosso, seus atrevidos habitantes destes loucos anos vinte. E também estou de volta – que o it’s carol já me gritava ao ouvido por um desconfinamento urgente.
Não descofinem, estive sempre aqui. Acho que ainda me lembro como é que isto se faz, por isso talvez possam confinar um bocadinho.
Perdidos por cem, perdidos por mil, não é assim?
Carol