Miúdos, vamos salvar o planeta!
Os miúdos brincam de manhã à noite. Não gostam de dormir muito para não perderem tempo ou para o tempo não se perder sem eles. Pedem mais cinco minutos, mais meia hora, mais uma vida de tempos livres e outras tantas livres das aulas. Os miúdos torcem o nariz à comida quando não são torcidos para gostarem de tudo. São os primeiros a pedir para sair da mesa, porque a noite ainda é uma criança e não há como dizer que não a mais um convite para brincar.
Os miúdos têm a melhor imaginação. Gostam de conversar com amigos imaginários, de voar para lugares distantes, de desenhar o que só está visível aos seus olhos, de criar dicionários com conceitos que mais ninguém precisa de entender. Os miúdos entendem-se como ninguém. Abraçam como se, assim, pudessem segurar o mundo nos braços. E choram, riem, esperneiam, viram as costas, deitam a língua de fora e batem o pé no chão. Na mesma medida. Mas depois voltam a abraçar e nunca mais se lembram do que aconteceu entre tantos abraços.
Os miúdos dão tudo o que têm. Mesmo quando não têm nada mais do que um Chupa Chups e uma mão lambuzada com sabor a morango. E não cobram nada de volta, ainda que não saibam recusar uma guloseima. Os miúdos têm línguas feitas de açúcar. Dizem que sim e que não com a mesma facilidade com que escolhem o próximo baloiço para andar. E, ao contrário do que todos pensam, não são inconsequentes. Sabem muito bem o que querem e até onde vão os limites da paciência das vozes gritadas, que lhes pedem cautela sempre que decidem correr para longe.
Os miúdos são surpreendentes. E surpreendentemente diferentes uns dos outros. Num abrir e fechar de olhos, as alturas marcadas na parede passam a ser um arco-íris de recordações à espera da altura certa para ganharem forma numa personalidade forte e dona do seu nariz. Os miúdos crescem. Mas nunca se esquecem de como era bom brincar de manhã à noite, ter a melhor imaginação e dar tudo o que tinham. Porque ser miúdo é não ter medo do que se pode perder. E alguns miúdos acabam por se perder pelo caminho, pelo tempo e pelo mundo. Outros continuam, simplesmente, destemidos, a concluir que nenhum chocolate foi trocado em vão, nenhum oceano foi sobrevoado sem destino, nenhuma birra foi perdida sem uma desforra à altura. Os miúdos serão sempre miúdos enquanto acreditarem.
Os miúdos são tudo o que o mundo quiser fazer deles. Mas, se um dia uma miúda conseguir pegar num pedaço do mundo e decidir que está na altura de parar de brincar com coisas sérias, não se admirem. Nem se assustem. Às vezes, uma miúda e uma mensagem importante são tudo o que precisamos para prestar atenção ao que temos vindo a ignorar. E, se muitos miúdos se juntarem a ela, não se deixem enganar. Todos sabemos que os miúdos se unem em duas situações: quando há pastilhas e quando têm mesmo razão. O mundo é dos miúdos, mas eles precisam de todos nós. Tal como nós precisamos deles, porque há muito tempo que deixámos de saber brincar com isto.
Obrigada por [nos] gritarem que é preciso salvar o planeta, miúdos!
Carol